quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Dra. Denise Menezes fala sobre TDAH

O que é transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH)?

É um quadro comportamental em que uma criança apresenta, de forma incompatível com a sua faixa etária, dificuldade para se concentrar no que faz, para conter seus impulsos e/ou agitação motora. Tal padrão de comportamento origina prejuízos na vida acadêmica, social ou afetiva do paciente.

O TDAH é um problema neurológico, psiquiátrico ou psicológico?

Tanto médicos como psicólogos podem ajudar um paciente com TDAH. O que muda é o instrumento utilizado por cada profissional. Os médicos usam remédios enquanto os psicólogos fazem terapia através das palavras, práticas corporais ou treinamentos comportamentais.
Em relação à medicina, cabe uma breve explicação sobre as duas áreas que tratam os pacientes com TDAH. Quando psiquiatria e neurologia deixaram de ser uma especialidade única – neuropsiquiatria –, as alterações de pensamento, humor e comportamento passaram a ser abordadas pela psiquiatria e as decorrentes de problemas estruturais do cérebro, pela neurologia. As pesquisas neurobioquímicas reaproximaram as duas especialidades e, embora psiquiatras e neurologistas tenham experiência clínica com patologias diferentes, algumas vieram a ser objeto de estudo de ambas as especialidades. Esse é o caso do TDAH.

O TDAH é um problema estrutural do cérebro?

Não necessariamente. Com frequência, é um problema funcional.
O diagnóstico de TDAH pelos critérios do DSM-IV-TR™ (American Psychiatric Association, 2002) é um diagnóstico comportamental e não inclui explicitamente uma causa. É preciso que se excluam diagnósticos psiquiátricos como transtornos do humor, de ansiedade, dissociativos ou de personalidade. A ênfase dada pelo DSM-IV à necessidade de se excluir outros diagnósticos psiquiátricos explicita que o conjunto de comportamentos e atitudes do TDAH não é exclusivo desse transtorno. Quando médicos não especializados no tratamento de TDAH ou pessoas leigas tentam definir esse diagnóstico, podem incorrer em equívocos por não serem capazes de excluir outras possibilidades diagnósticas.

Como é feito o diagnóstico de TDAH?
Primeiramente, são feitos os seguintes procedimentos: anamnese detalhada da história de vida da criança e de seu ambiente familiar e social; observação clínica durante a consulta e exame neurológico. A seguir, pode-se utilizar critérios provenientes de sistemas classificatórios como o DSM-IV ou algum dos vários questionários inspirados nele. Finalmente, é solicitada uma avaliação neuropsicológica.
Nenhum desses métodos garante um diagnóstico definitivo porque o comportamento pode ter como bases quadro de ansiedade, transtornos de humor ou de personalidade, desajuste na dinâmica afetivo-emocional familiar ou inadequação da linha pedagógica da escola.
Quando o paciente tem menos de sete anos de idade, não se deve ter pressa para definir um diagnóstico. Nesse caso, o acompanhamento da criança em médio ou longo prazos ajudará a confirmar ou afastar nossa suspeita.

Um quadro de ansiedade pode ser tão intenso a ponto de ser confundido com TDAH?

Sim. Quanto mais inconsciente for a causa do sofrimento psíquico, mais ela irá se manifestar através de comportamentos fora do controle do paciente. Para quem acompanha de longe, tais comportamentos parecem tão desproporcionais ao fator desencadeante que, por isso, são classificados como impulsividade ou hiperatividade. Isso pode acontecer não apenas com transtornos ansiosos, mas também com os depressivos, neuróticos e outros.
Qualquer que seja a causa de seus comportamentos, quando uma pessoa não consegue controlar seus impulsos ou hierarquizar os estímulos que a rodeiam e, assim, não se mostra capaz de escolher seu foco de atenção, essa dificuldade pode tão intensa que se encaixe no diagnóstico de TDAH.

Uma criança normal pode aprender a funcionar como TDAH?

Sim, até certo ponto. Vamos raciocinar juntos:
Graças à plasticidade cerebral, qualquer atividade que uma pessoa desenvolve gera circuitos cerebrais estáveis – a isso se dá o nome de aprendizado. A plasticidade cerebral da criança é muito intensa. Através de hábitos de vida a criança vai construindo seu cérebro.

Por outro lado, no mundo atual, há excesso de informações e de estímulos. Exemplo da consequência disso é que, há alguns anos, no Japão, milhares de pessoas tiveram que ir ao pronto socorro devido à excessiva foto-estimulação a um desenho animado veiculado na televisão, sendo que centenas delas tiveram convulsões. Por isso, um trecho do desenho animado precisou ser cortado para que o filme fosse novamente liberado.

Nos jogos a maioria das imagens é apresentada de forma quase frenética. Assim, o cérebro da criança aprende a processar esse excesso de estímulos e os circuitos dessa maneira gerados determinam um estilo de comportamento que passa a ser parte integrante da sua estrutura cerebral. Trata-se de uma bola de neve.

Outro fato: muito do que o padrão de exigência atual valoriza está além da possibilidade humana normal de assimilação ou, pelo menos, além da capacidade de assimilação de determinada criança. Por exemplo, uma que tenha um temperamento mais contemplativo pode sentir-se na obrigação de ser como as outras e ultrapassar seus limites. Às vezes, a própria família exige isso dela.
Nesses casos, é preciso mudar a meta. Existem diversas opções profissionais que precisam de maior introspecção e lentidão. É importante respeitar as diferenças e evitar encaixar a criança em padrões, exigindo o que é esperado pela sociedade ou o que o mercado de trabalho indica como mais rentável.

Alguém pode ter um quadro comportamental semelhante ao TDAH porque está desmotivado de uma maneira muito significativa?

Pode sim, principalmente quando há desatenção sem hiperatividade. Exemplo disso ocorre quando uma pessoa escolheu atuar em uma área profissional por influência de outras pessoas ou por uma necessidade circunstancial quando, na verdade, seus dons e suas necessidades são diferentes. Nesse caso, talvez o paciente desenvolva uma dificuldade atencional que, em outras circunstâncias, seria facilmente administrada e não seria intensa a ponto de ser enquadrada no diagnóstico de TDAH.

Quer dizer que existe TDAH sem hiperatividade, só com desatenção?

Sim. Se você acessar o texto Critérios diagnósticos do TDAH você verá que o DSM-IV inclui esse sub-tipo de transtorno, predominantemente desatentivo. O nome oficial do transtorno ainda é TDAH, mas muitas vezes chamamos esse quadro de DDA (desordem de déficit de atenção) ou de TDA (transtorno de déficit de atenção). As crianças com DDA apresentam quadro atencional muito parecido com o DPA (desordem de processamento auditivo), que em ambientes ruidosos mostram-se incapazes de focar a atenção e se dispersam. Além de um diagnóstico diferencial que deve ser lembrado, o DPA pode coexistir com TDAH como comorbidade.

Quando todos os pré-requisitos dos sistemas classificatórios para diagnóstico de TDAH são preenchidos significa que a origem do problema é orgânica?

Não necessariamente. Há grande chance de a causa ser orgânica, mas há a possibilidade de ter outro motivo. Pode-se verificar que os circuitos neuronais estão completos, com suas redes sinápticas maduras e motivos afetivos emocionais impedem que eles sejam adequadamente utilizados.
Se nos prendermos apenas aos resultados dos questionários, estaremos abrindo mão de um método diagnóstico fundamental que é a impressão clínica obtida pela anamnese, pela observação no consultório, pelo olhar mais abrangente sobre a família e o meio em que o paciente vive.
Testes e questionários ajudam, mas não são infalíveis. Às vezes, estamos diante de um paciente que preenche os pré-requisitos para um determinado diagnóstico, mas estamos convencidos de que não se trata disso. Outras vezes, ocorre o contrário, porém temos certeza de que é aquele transtorno que ele tem. Medicina não é uma ciência exata e esquecer isso nos fará incorrer em muitos erros.

Se chegarmos à conclusão de que, realmente, se trata de TDAH, qual pode ser a causa?
Podemos estar diante de um caso de lesão cerebral ou imaturidade neurológica que atinge os circuitos cerebrais responsáveis pelo controle da atenção e dos impulsos afetivo emocionais.
Tanto na lesão cerebral como na imaturidade neurológica o circuito neuronal é ineficiente. Assim, o paciente tem dificuldade para hierarquizar os estímulos do meio ambiente e escolher um deles como foco de atenção. Além disso, ele apresenta dificuldade em manter informações circulando em áreas subcorticais do cérebro durante a execução de uma tarefa, incorrendo em erros por causa disso. Da mesma forma, toda emoção que sente irá aflorar em forma de comportamento. Por exemplo, enquanto um colega de classe pensa “Que professora chata”, mas diz “Está bem, professora”, uma criança com TDAH dirá para a professora, de maneira irrefletida, “Você é uma chata”.

Qual a diferença entre TDAH por lesão cerebral e por imaturidade neurológica?
No TDAH por lesão cerebral os neurônios que compõem o circuito controlador e organizador de ações, emoções e comportamentos não existem em quantidade suficiente. A lesão cerebral decorre de uma agressão sofrida pelo cérebro antes, durante ou depois do nascimento. Além do TDAH a lesão pode gerar outros sintomas como paralisia motora, deficiência mental etc. Muitos pacientes com quadros neurológicos graves têm como complicador de tratamento ser pouco colaborativo por causa de um TDAH.

No TDAH por imaturidade neurológica o circuito neuronal existe, mas não é eficaz. A informação química entre os neurônios não é transmitida, pois as sinapses não se comunicam eficientemente. Provavelmente, a programação genética do paciente com TDAH determina que esses circuitos sejam desenvolvidos mais lentamente do que na maioria das pessoas. Por esse motivo, nos casos não lesionais, costumamos perceber nitidamente uma história familiar em que o pai ou a mãe apresenta algum nível do transtorno.

O que pode causar uma lesão cerebral que leve a um quadro de TDAH?

A lesão cerebral pode ser causada por qualquer situação que agrida o cérebro em fase precoce da vida e atinja os circuitos envolvidos no transtorno. São exemplos dessas situações: anóxia de parto, meningite nos primeiros dias de vida e obstrução de vasos sanguíneos cerebrais durante o período intrauterino.

Caso o quadro surja na vida adulta após um traumatismo craniano, por exemplo, não pode ser considerado TDAH mesmo pareça ser semelhante. Isso porque, para que se faça esse diagnóstico oficialmente, é necessário que os sintomas tenham se iniciado, de acordo com alguns autores, antes dos sete anos de idade, e para outros, antes dos quatro anos.

O tratamento médico é diferente se a causa do TDAH for lesão cerebral ou imaturidade neurológica?
Não. Do ponto de vista medicamentoso, a definição do tratamento ocorre a partir das seguintes questões: intensidade do quadro; nível de prejuízo pedagógico, afetivo ou social; existência de comorbidades e os princípios e filosofia de vida da família do paciente.

Quer dizer que não existe uma forma única de tratamento?

Exatamente. Às vezes, optamos por terapia psicológica, aconselhamento da família e dos cuidadores, acompanhamento terapêutico ou pedagógico do paciente, antes de decidirmos introduzir medicamentos.

De maneira geral, baseada na impressão clínica, eu trato meus pacientes com homeopatia. Solicito avaliação neuropsicológica quando tenho dúvida diagnóstica ou quando decido receitar alopatia, porque dará respaldo para a introdução de medicamentos. Nesse caso, também são requisitados exames clínicos laboratoriais, eletroencefalograma (EEG) e, algumas vezes, avaliação cardiológica. Solicito também avaliação neuropsicológica quando o tratamento dos pacientes não evolui conforme o esperado ou quando há suspeita de transtornos específicos de aprendizagem associados.

Uma criança desatenta tem sempre dificuldade escolar pedagógica?

Não é obrigatório que ocorram dificuldades pedagógicas. Uma criança desatenta pode deixar de aprender a matéria por não ter ouvido a explicação, por ter dificuldade para memorizar ou por não conseguir se organizar minimamente para que o aprendizado aconteça. Por outro lado, uma criança muito inteligente com TDAH leve ou moderado, sem transtornos específicos de aprendizagem associados, pode sair-se muito bem do ponto de vista pedagógico.

Nesse caso, qual seria a queixa escolar?
A queixa escolar seria relacionada ao comportamento. Um paciente pode ser bem avaliado nas provas, mas ser agitado e impulsivo a ponto de atrapalhar os colegas em sala de aula. Devido ao fato de sua impulsividade fazê-lo reagir sem pensar às contrariedades, pode envolver-se em brigas frequentes. Nesse caso, o transtorno compromete mais a vida afetiva ou social do que a pedagógica.

É possível TDAH sem queixa escolar?

Sim, é possível, embora não seja frequente. O diagnóstico de TDAH requer que as queixas aconteçam em pelo menos dois ambientes. A escola, pelo fato de reunir muitas crianças e exigir do paciente uma atenção ou um autocontrole que ele não tem, apresenta condições propícias para que as queixas ocorram.

E a vida familiar? O TDAH é causa ou consequência dos problemas em casa?

Boa pergunta.
Precisamos estar atentos para definir onde tudo começou. A dinâmica familiar complicada pode levar uma criança a ter comportamento agitado e rebelde, mas uma criança com comportamento agitado e rebelde pode gerar complicações na dinâmica familiar.
É necessária experiência clínica e, geralmente, auxílio de profissional da psicologia para avaliar essa questão. Desvendá-la é fundamental, pois a conduta médica pode ser muito diferente dependendo da avaliação realizada.

A solução para o caso em que a dinâmica familiar mostra-se complicada não é medicar a criança. São outros os problemas e a criança pode estar sendo a vítima e não a causadora da situação. Medicar seria mascarar um sintoma familiar que precisa ser enfrentado.

Por outro lado, quando a criança apresenta déficit de atenção acompanhado de hiperatividade/impulsividade pode gerar uma dinâmica familiar ruim. Devido às brigas constantes e desobediências, aos comportamentos de risco e barulho que fazem, os pacientes podem construir em casa um ambiente desagradável, cansativo ou mesmo exasperante. Os adultos têm muita dificuldade de lidar com a própria impotência, pois uma criança desobediente gera a sensação de “ele não me obedece”, “ele não me respeita”, ao invés de “ele não consegue”.

Pais e cuidadores também têm seus problemas pessoais e nem sempre estão em condições de compreender ou ser úteis para uma criança hiperativa. Por isso, castigos repetidos, excessivos ou injustos podem levar o paciente a se sentir discriminado, incompreendido, injustiçado e isso acabar colaborando para um comportamento intencionalmente rebelde. O problema cresce como uma bola de neve e cria um círculo vicioso complexo. Com freqüência, só um profissional experiente da psicologia consegue ajudar à família e aos médicos.
 
Isso é o que chamam de transtorno de oposição desafiador (TOD), uma comorbidade do TDAH?
Sim e não. Explico:

Comorbidades são doenças que coexistem, sem que uma seja a causa da outra. Embora o Transtorno de oposição desafiador (TOD) seja considerado comorbidade, em minha opinião, ele é um comportamento reativo porque tem relação de causa e efeito.

Uma criança que cresce sentindo-se um peso para aqueles que a cercam pode usar a agressividade como defesa. Já escutei de paciente, justificando-se de uma atitude indisciplinada na escola: “Se eu não tivesse feito aquilo, mesmo assim, diriam que fui eu. Então, eu fiz”. Quanto maior a angústia, quanto mais comprometida a autoestima da criança, maior será a chance de aparecimento de um comportamento opositor. O ser humano, criança ou adulto, que se sente constantemente rejeitado pode desistir de ser compreendido e, por sua vez, desistir de compreender os que o cercam.

É preciso medicar essa agressividade?

Eu diria que é preciso tratá-la. De que forma? Depende do caso.
Sempre com terapia psicológica. Associar homeopatia ajuda muito e, às vezes, é necessário utilizar alopatia também.
Vamos raciocinar juntos:
1. O TDAH pode cursar com impulsividade. Essa impulsividade faz com que o paciente se precipite em transformar pensamentos e emoções em ações;
2. Essas ações podem ser muito agradáveis e criativas (um abraço apertado fora de hora que, no entanto, é bem vindo; uma atitude de compaixão com desconhecidos na rua etc.);
3. As crianças podem ter a intenção de ser agradáveis e terminarem de forma desastrada (a criança corre para ajudar e derruba o pacote que você tem nas mãos quebrando seu conteúdo, por exemplo) ou de forma perigosa (como subir no telhado da escola para pegar um objeto que alguém deixou cair do edifício ao lado);
4. As crianças podem ser extremamente agressivas. Por exemplo, a criança tem ciúmes do irmão e bate nele com o pretexto mais insignificante ou o paciente sente-se desprezado pela turma e provoca acidentes, intencionalmente, para extravasar seus sentimentos. Neste caso, frente a pessoas ou situações específicas, a impulsividade se manifesta de forma destrutiva.
5. Finalmente, as ações podem refletir o modo como a criança se sente em relação à vida. Se ela se sente rejeitada de maneira geral, passa a rejeitar tudo o que vem do meio. Se isso acontecer de forma sistemática, pode se tornar um transtorno de oposição desafiador.
Chegamos agora no ponto que eu quero abordar:
No TDAH a impulsividade é neurológica e gera a imediata transformação de pensamentos e emoções em atos, mas, o conteúdo dessa impulsividade é psíquico. Dependendo de fatores psicológicos esse conteúdo será: agradável, criativo, desastrado, perigoso, agressivo, desafiador ou opositor. Em última análise, depende de como a criança percebe a própria vida.
A impulsividade deixa aparecer mais facilmente o que o paciente tem dentro de si.
Podemos tratar essa impulsividade com medicamento, homeopático ou alopático, mas tratamos o conteúdo psíquico da impulsividade com terapia psicológica.
É importante ter em mente que se usarmos medicação psicotrópica de forma banalizada corremos o risco de não percebermos o grito de socorro embutido no comportamento agressivo. Preciso ressaltar que o uso talvez exagerado de medicamento psicotrópico para tratar casos de TDAH ocorre frequentemente por pressão de escolas ou famílias. A intenção é boa, mas o resultado pode ser desastroso.

Homeopatia é um tratamento alternativo?

Não. Homeopatia é uma alternativa de tratamento e não um tratamento alternativo. Homeopatia é uma especialidade médica reconhecida e representada na Associação Médica Brasileira.


É melhor tratar TDAH com homeopatia ou alopatia?

Depende. Há vantagens e desvantagens em ambas as abordagens. Algumas já bem conhecidas e documentadas, outras ainda são especulações teóricas ou achados empíricos.
Primeiramente, precisamos lembrar que nosso cérebro, como todo o nosso corpo, utiliza mecanismos de feedback para seu funcionamento e desenvolvimento. Por exemplo, o pâncreas libera insulina na circulação sanguínea quando temos glicose no sangue; para que o cérebro desenvolva o circuito da visão, é preciso haver o estímulo luz; as áreas de associação da audição só se desenvolvem se nós ouvirmos etc. A natureza não desperdiça energia. Generalizando, podemos dizer que só quando precisamos de uma determinada função é que o cérebro desenvolve e aperfeiçoa as sinapses relacionadas a ela.

Agora vamos raciocinar juntos.
Se alguém tem um circuito cerebral imaturo, suas sinapses não estão adequadamente desenvolvidas e, por isso, não haverá transmissão bioquímica das informações de um neurônio para o outro. Se suprirmos esse processo químico com um medicamento que atua nos receptores em que a química endógena não está atuando – e este é o caso do tratamento alopático –, o circuito vai funcionar. Para aqueles pacientes que não têm ou têm poucos efeitos colaterais, isso pode ser quase milagroso, pois a vida muda imediatamente para melhor. O paciente torna-se atento, aprende, tudo melhora. A vantagem para quem se adapta à medicação alopática é a rapidez do efeito, levando a uma melhora significativa na vida escolar, familiar e social.

Já vimos as vantagens do tratamento alopático. Quais são as desvantagens?
Primeiramente, os efeitos colaterais. Estes podem acontecer com qualquer remédio, mais ainda com aqueles que agem diretamente no sistema nervoso central (SNC).
Efeitos colaterais graves não são comuns. Quem receita alopatia procura ser cuidadoso, solicitando avaliação cardiológica e EEG antes de iniciar a medicação. Perda de apetite, com conseqüente diminuição no crescimento e no ganho de peso, são efeitos relativamente comuns.
Devido ao uso de alguns dos remédios para TDAH, transtornos latentes podem passar a ser manifestos, tais como o transtorno obsessivo compulsivo e os tiques múltiplos. Ansiedade e agitação podem aumentar durante o uso ou a abstinência do remédio. Nesse último caso, a família pode optar por ministrar o medicamento inclusive em finais de semana e feriados, quando na verdade deveria ser feita uma pausa. Também pode ocorrer idiossincrasia, com o paciente passando a apresentar apatia e humor depressivo.

Além disso, o organismo tende a desenvolver tolerância ao remédio, sendo necessário o aumento progressivo das doses e, consequentemente, há maior chance de ocorrerem efeitos colaterais. As doses maiores acabam levando à necessidade da administração de outros medicamentos para o controle dos efeitos colaterais, no entanto, esses novos remédios têm, por sua vez, seus próprios efeitos colaterais. No caso de o paciente apresentar comorbidades, pode ser necessário medicá-las também.

É comum eu ser procurada por pais desapontados porque acham seu filho muito diferente do que era antes do início do tratamento alopático. Falam “Ele parece outra criança” ou “Não parece o meu filho” e preferem lidar com os sintomas do TDAH e tentar outra abordagem terapêutica.
É importante lembrar que cada paciente é uma individualidade e tem sua própria maneira de responder aos estímulos químicos. Não devemos ter preconceito quanto ao tratamento alopático, apenas sermos rigorosos quanto à sua indicação e atentos à relação de custo benefício.
Gostaria de ressaltar de que parte dos meus pacientes me procurou por não ter se adaptado ao tratamento alopático. Assim, há um desvio na minha amostragem. Pacientes que evoluem bem quando tratados alopaticamente provavelmente não procuram uma alternativa de tratamento. voltar
Você se referiu anteriormente a desvantagens que são especulações teóricas ou achados empíricos? Quais são?

Essas acontecem com todos os pacientes.
Lembram-se de que o desenvolvimento dos nossos circuitos cerebrais se dá por feedback? Então, o cérebro de quem toma o remédio não discrimina que a substância medicamentosa não foi fabricada pelo próprio corpo e que foi acrescentada através da medicação. Se o organismo está funcionando isso significa que o cérebro está pronto, não há necessidade de amadurecer nada. Quando o paciente interromper o uso do medicamento, verá que sua dificuldade persiste. É por isso que muitos médicos dizem para quem tem TDAH “você não está assim, você é assim”.

E essa afirmação não está correta?

Nem sempre.
Atualmente, existe resistência dentro da medicina em se dar opinião pessoal não corroborada por pesquisa científica. Assim, peço licença para expressar a minha opinião, uma vez que os resultados do tratamento homeopático sugerem uma evolução diferente. Na minha experiência profissional com homeopatia, a maioria dos pacientes melhora progressivamente até o desaparecimento do transtorno e consegue manter seu perfil de personalidade característico sem que isso lhe traga algum prejuízo.

A homeopatia ajuda a amadurecer os circuitos sinápticos imaturos?

Os resultados do tratamento homeopático sugerem que sim. Pode haver sintomas residuais considerados sequelas de personalidade, quando as necessidades de âmbito afetivo-emocional e pedagógico da criança não são contempladas ao longo do seu tratamento. Por isso é de fundamental importância oferecermos ao paciente com TDAH um tratamento multidisciplinar.

Outros médicos homeopatas também têm esse resultado?

Há muitas pesquisas homeopáticas sérias bem sucedidas, publicadas em periódicos respeitados. Algumas apresentam resultados com êxito total, outras com sucesso parcial sugerindo que, assim como no uso da alopatia, o efeito do medicamento desaparece após a interrupção do tratamento.
Atribuo esses resultados ao período de acompanhamento inferior a dois anos nessas publicações. Na minha experiência o tratamento homeopático do TDAH dura muito mais tempo do que isso. Outros motivos possíveis para essa diferença de resultados talvez estejam nas linhas de tratamento homeopático utilizadas nas pesquisas. Esta seria outra discussão muito interessante que, no entanto, não seria adequado realizar neste texto. Para entender o fundamento do tratamento homeopático, leia o manual de homeopatia deste site.

Qual é a vantagem da homeopatia?

O paciente não corre risco dos efeitos colaterais oferecidos pela alopatia e percebe, ao longo do tratamento, uma evolução para auto suficiência, ou seja, não é necessário o acompanhamento para o resto da vida.

Na maioria dos pacientes tratados com homeopatia, observa-se a real melhora do quadro. Ao final do tratamento, que é longo, os pacientes estão com os processos atencionais normalizados e a impulsividade apresentada não assume intensidade que a classifique como um transtorno. Essas pessoas podem manter um perfil de personalidade aberto ao novo, mais ousado, sem que isso constitua uma característica desagradável para si ou para os outros. Pelo contrário, às vezes, é uma grande vantagem.

Preciso ressaltar que essa evolução acontece nos casos bem sucedidos, que são a maioria, porém, há pacientes que não respondem bem à homeopatia e é preciso administrar medicamento alopático.
Na maioria dos casos que não evoluíram bem com o tratamento homeopático, a família ou os próprios pacientes desistiram antes de haver tempo suficiente para que essa evolução acontecesse. Geralmente, eram casos que, a despeito da minha indicação, não eram acompanhados por uma equipe multiprofissional.

Qual a desvantagem do tratamento homeopático?

É a demora dos resultados.
É necessária orientação à escola e à família para que todos colaborem. Precisamos recordar às pessoas que lidam com o paciente que sua melhora é paulatina. Ele deve ser comparado com ele mesmo e não com o resto da turma ou com os irmãos. Sempre que algo desagradável ou preocupante acontecer, devemos comparar a frequência e a gravidade de fatos semelhantes nos últimos meses e no ano anterior. É muito importante valorizar os progressos alcançados!

A demora para se atingir resultados acontece porque a homeopatia é lenta para agir?
Nem sempre.

Um dos motivos é a dificuldade para definir o remédio de fundo do paciente. As pessoas não têm auto conhecimento suficiente para responder de forma adequada às perguntas do médico. Existem mais de 3000 remédios homeopáticos e, muitas vezes, apenas depois de várias consultas e tentativas é possível determinar o medicamento mais adequado.

Depois de definir o remédio de fundo, é preciso realizar ajustes progressivos nas suas potências. A evolução pode ocorrer das seguintes maneiras:

1. A princípio o paciente melhora muito, porém por pouco tempo. O risco, neste caso, é que a família, ao perceber a curta duração dos benefícios, imagine que será sempre assim e abandone o tratamento. Na realidade, a cada nova receita a duração do efeito aumenta. Com a progressão do tratamento os sintomas diminuem cada vez mais e a melhora persiste por tempo cada vez mais longo. Quando ele conseguir ficar muito tempo bem com a mesma receita programamos a retirada lenta da medicação, até que ele tenha condições de alta.

2. A melhora é pequena e gradual. O paciente melhora um pouco a cada receita e só após algum tempo de tratamento ele apresenta um resultado animador. Nessa situação, o risco é que a família e a escola não tenham paciência ou condições de esperar uma melhora satisfatória.

Esses resultados são conhecidos pelos médicos em geral?

No Brasil, acredito que não. No nosso país, não existe uma cultura de se incluir o raciocínio homeopático ao lidarmos com quadros neurológicos. De maneira geral, homeopatia não é ensinada em cursos de graduação e o paradigma da ciência oficial não abarca os conceitos filosóficos que dão suporte ao raciocínio médico homeopático. Apesar de existirem muitas pesquisas comprovando a utilidade da homeopatia no TDAH, a maioria dos colegas não lê sobre isso ou cita apenas os trabalhos que não obtiveram sucesso.

Como fica a vida escolar e social do paciente durante o período inicial do tratamento homeopático, antes de ocorrer uma melhora clínica consistente?

Depende do paciente. Alguns apresentam melhora suficiente e consideram sua vida satisfatória apenas com o tratamento homeopático e com acompanhamento psicológico. Se houver comorbidade na área da linguagem ou na pedagógica, o paciente precisará de tratamento fonoaudiológico e/ou psicopedagógico. Outras vezes, é necessário fazer psicomotricidade etc. Há pacientes que necessitam de acompanhamento terapêutico dentro da própria escola. Quanto maior o número das comorbidades, maior é a necessidade de atenção multiprofissional.

E a terapia psicológica? Existe uma linha teórica ideal?

Depende do caso. A terapia cognitiva comportamental é de grande utilidade para ensinar estratégias para que o paciente possa lidar com suas dificuldades. Geralmente, é uma terapia mais objetiva e de duração curta. Porém, às vezes, os pacientes têm um comprometimento afetivo e emocional em uma esfera mais profunda e eu opto por indicar uma terapia psicodinâmica. Quando os comportamentos defensivos estão muito sólidos, é preciso cuidar desse sofrimento psíquico para que as outras abordagens fluam, para que a criança se arrisque a tentar, ouse aprender. Frequentemente é útil complementar um trabalho com outro.

O que você aconselha para pais que precisam decidir sobre qual tratamento escolher?

Procurem se informar sobre o assunto em várias fontes diferentes.
Levem em consideração o que sabem sobre o assunto e escolham um prhttp://www.dradenisemenezes.com/artigo_convTDAH.htmlofissional indicado por alguém competente para fazer tal indicação e que tenha uma abordagem que faça sentido para os pais.
Confiem no profissional escolhido relatando todas as dificuldades encontradas no percurso. Qualquer que seja a linha de tratamento escolhida, o trabalho é longo e construído dia após dia.
Por fim, não tenham medo de mudar de opção quando as evidências e a consciência assim pedirem. Todos os caminhos têm suas vantagens e desvantagens e, às vezes, só caminhando é possível saber se a opção escolhida estava correta.

Nenhum comentário:

Postar um comentário