quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Brincar: Dificuldades no Desempenho Ocupacional de crianças com Perturbação de Espectro Autista


“Play is a secret that occupational therapists have danced around for years”
(Parham & Fazio)

O brincar é a principal ocupação das crianças. É uma actividade espontânea, voluntária, criativa e intrinsecamente motivadora. Enquanto as crianças brincam, desfrutam da interacção com o outro e, ao mesmo tempo, retiram prazer dessas experiências Através desta actividade, as crianças aprendem competências necessárias para interagirem adequadamente com o meio, ao nível motor, cognitivo, emocional e da linguagem. As crianças com perturbações do desenvolvimento podem ter alterações nas competências que são requeridas no brincar. Quando um terapeuta ocupacional lida com uma criança com PEA um dos seus principais objectivos de intervenção é, sem dúvida, promover o brincar. Assim, pretendemos melhorar estas competências de modo a que os indivíduos consigam, através da interacção com o meio, adquirir novas aptidões. No entanto, o brincar tem que ser adequado às características individuais da criança, ou seja, não pode ser demasiadamente simples nem demasiadamente complexo, de modo a evitar desinteresse e frustração. Para além das competências motoras, esta actividade requer que haja uma boa capacidade de integrar informação, comunicar verbal e não verbalmente, compreender e responder aos estímulos.
O planeamento motor ou praxis é o processo cognitivo que precede um comportamento; envolve a organização do timing e sequência das acções (Parham & Fazio, 1997). Engloba a capacidade de pensar sobre o que fazer e de ter respostas adaptativas face a situações diferentes e inesperadas. A eficácia deste processo depende em grande parte da qualidade da integração dos inputs sensoriais. Este processo de integração sensorial contribui para a construção do esquema corporal, fundamental para o planeamento motor. Uma criança que não tenha consciência corporal, não consegue interagir eficazmente com o meio. A integração sensorial é constituída por três fases (ideação, planeamento e execução), todas elas fundamentais durante o brincar. A ideação é a capacidade de conceptualizar uma ideia do movimento que se pretende fazer, de modo a estabelecer uma interacção positiva com o meio. Após saber que movimento se quer efectuar, é formulado um plano para pôr em prática essa ideia, que inclui como organizar as acções no espaço e tempo (planeamento). Depois parte-se para a realização em si do movimento, a parte observável de todo o processo (execução). Durante todo o processo ocorrem mecanismos de feedback. Para um completo envolvimento no brincar, a criança tem de ser capaz de criar novas ideias à medida que formula e executa os seus planos motores.
















As crianças com dispraxia são tipicamente desajeitadas, desorganizadas e apresentam diversas dificuldades nas diferentes áreas de ocupação. Podem ter problemas ao nível do desenvolvimento motor, interacção social e performance escolar. Ao se depararem com estas dificuldades podem desenvolver baixa auto-estima, para além de experienciarem frequentemente grande ansiedade, frustração, irritabilidade. Uma intervenção delineada para melhorar a praxis teoricamente beneficia as competências requeridas no brincar. Da mesma forma, se usarmos o brincar como meio terapêutico pode haver melhorias ao nível do planeamento motor na criança. Assim, pode dizer-se que a praxis e o brincar estão fortemente interligados. O brincar é uma importante ferramente terapêutica para desenvolver as competências de planeamento motor.

Quais são as principais dificuldades das crianças com PEA?
As crianças com PEA têm dificuldades significativas nas várias etapas do planeamento motor, especialmente na ideação, planeamento e sequenciação e no feedback, devido às suas limitações no processamento e integração dos estímulos sensoriais, no esquema corporal, no pensamento abstracto, na interpretação das pistas do meio, à sua obsessão pela estruturação e aos comportamentos peculiares (comportamentos estereotipados, posturas anormais, atrasos na resposta motora). Quando estas crianças rejeitam o movimento devido a uma sobrecarga do sistema nervoso ou quando se envolvem durante a maior parte do tempo em actividades repetitivas, podem perder oportunidades de desenvolver mecanismos de feedback. Isto pode comprometer de forma significativa o processo de planeamento motor.
A execução é a área menos comprometida, sendo sobretudo afectada pelas dificuldades motoras que os autistas apresentam, sobretudo a nível da iniciação e manutenção do movimento.
Outra área problemática no brincar e planeamento motor destas crianças é a imitação. De facto, têm dificuldades na imitação de movimentos, de utilização de objectos, de expressões e gestos, apresentando assim dificuldades no desenvolvimento de novos comportamentos e formas de brincar. As crianças com PEA apresentam dificuldades na imitação devido à incapacidade de estabelecer a ponte entre a percepção e a acção.
Devida a estas dificuldades no planeamento motor, as crianças com PEA podem apresentar um brincar muito concreto e repetitivo, com pouca exploração do meio. Preferem também um brincar solitário, não procurando a interacção com os pares. Têm também dificuldades no processamento, discriminação sensorial e no esquema corporal o que vai afectar o processo de planeamento motor. Estas crianças têm dificuldade na transição de uma actividade para outra e na generalização de ideias, a capacidade de perceber conceitos temporais está afectada.

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