quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Neurônios Espelho


     Durante muito tempo a Ciência colocou as seguintes questões: Como percebemos, quase imediatamente e instintivamente os pensamentos, sentimentos e intenções das outras pessoas? Porque reagimos tão espontaneamente às acções dos outros? Nos anos 90, a descoberta dos neurónios espelho veio dar algumas respostas. Estas células nervosas, localizadas no córtex pré-motor, disparam quando realizamos uma tarefa e também quando observamos alguém a realizar uma determinada acção. Os neurocientistas acreditam que este mecanismo neural tem implicações ao nível das funções cognitivas superiores: através dele conseguimos compreender espontaneamente as intenções, emoções e acções das outras pessoas. Este sistema é involuntário e automático, não temos que pensar para saber o que o outro está a fazer ou a sentir. Simplesmente sabemos. É fundamental perceber os comportamentos do outro enquanto o observamos a realizar uma determinada acção para que possamos adquirir uma série de competências. Este tipo de neurónios parece ter um papel importante na aprendizagem de tarefas motoras, aquisição da linguagem e de competências sociais.
     Os indivíduos com PEA têm problemas ao nível da interacção social, comunicação verbal/não-verbal, imitação e empatia. As investigações mais recentes apontam para disfunções no sistema de neurónios espelho em autistas, tendo consequências directas no desenvolvimento destas crianças. Os circuitos cerebrais que nos permitem compreender as acções dos outros parecem estar alterados nas pessoas com este tipo de perturbação. O facto de os indivíduos com PEA terem grandes dificuldades (ou até mesmo serem incapazes) em “ler a mente” dos outros e estabelecer relações de empatia pode estar associado a alterações no funcionamento deste tipo de neurónios. Daí a dificuldade destas crianças em compreender e responder adequadamente aos outros. Aprendemos por modelação. Deste modo, uma disfunção no mecanismo que é responsável pela imitação irá comprometer directamente a capacidade de aprender. Como se sabe, as crianças com PEA não compreendem metáforas e interpretam-nas literalmente. Actualmente, os cientistas procuram saber se a disfunção no sistema de neurónios espelho tem algum tipo de relação com esta incapacidade. Resumindo, os défices ao nível comportamental, da interacção social e comunicação/linguagem parecem estar relacionados com a disfunção deste sistema neuronal.
     Ao desvendar mistérios antigos, esta descoberta veio abrir novos caminhos na Ciência, nomeadamente novas possibilidades de tratamento de diversas patologias, tais como as PEA. “Eu prevejo que os neurónios espelho façam pela Psicologia o que o DNA fez pela Biologia” (V.S. Ramachandran ).




3- Histórias de Sucesso

     A vida não lhes foi fácil. Em alguma fase do seu percurso descobriram que os comportamentos obsessivos - compulsivos tinham uma justificação: padeciam de transtornos autistas. Apesar de tudo, tornaram-se profissionais de êxito, admirados por todos. Eles são autistas com competências especiais a nível visual e espacial.

Kim Peek: sabe de cor 7600 livros e todos os roteiros dos Estados Unidos, o seu país natal. O personagem que Dustin Hoffman interpretou em “Rainman” foi baseado nas suas competências. Kim é um autista e com a sua experiência ajuda pessoas com o mesmo problema.

Richard Wawro: este pintor escocês de êxito internacional é autista. Desde criança, extravasou as suas obsessões em traços de cor que hoje são reconhecidos como obras de arte pelos melhores especialistas do mundo.

Vincent da Rocha Dioh: tem 7 anos, é autista e é português. Não pronuncia uma única palavra. A pintura é a sua única forma de comunicar. Por quatro vezes expôs a sua obra ao público.




4- “Idiot Savant”

     O termo “idiot savant” surgiu em 1985, e caracteriza determinados indivíduos com certas habilidades brilhantes e raras, no que se refere à realização de determinadas tarefas que, sendo tão complexas, poucos conseguiriam levar a cabo. A síndrome de Savant (aceite na época que era alguém com o QI inferior a 25) é considerada um distúrbio psíquico com o qual a pessoa possui uma grande habilidade intelectual aliada a um déficit de inteligência.

      O autismo parece estar bastante associado a indivíduos com estas características, mas os idiots savants surgem também associados a debilidades mentais, mesmo na ausência de características autistas. Estes indivíduos são capazes da execução de tarefas extremamente complexas com aparente facilidade, tais como cálculo de datas em calendários (esta tarefa consiste na associação de datas e dias da semana). No entanto, existe um paradoxo pois estas capacidades brilhantes estão em concomitância com atraso mental.
      Há ainda muito a ser esclarecido sobre a síndrome de savant, pois não existe nenhuma teoria que descreva, exactamente, como e por que ocorre a genialidade no savant.
      Estudos realizados por Bernard Rimland, do Autism Research Institute (Instituto de Pesquisa do Autismo), em San Diego, Califórnia, vêm corroborar com a tese de que algum dano no hemisfério esquerdo do cérebro faz com que o direito compense a perda. Rimland possui o maior banco de dados sobre autistas do mundo, com informações sobre 34 mil indivíduos. Ele observa que as habilidades savants presentes em pessoas autistas são, mais frequentemente, associadas às funções do hemisfério direito (incluem música, arte, matemática, formas de cálculos, entre outras aptidões), e as habilidades mais deficientes são as relacionadas com as funções do hemisfério esquerdo (incluem linguagem e a especialização da fala). Técnicas de imagem cerebral mostram que as pessoas com autismo activam diferentes áreas de processamento cerebral quando desenvolvem uma tarefa (Kim, 2005).
      Segundo Howe, a grande maioria dos idiots savants são do sexo masculino e possuem personalidades marcadamente autistas. Estes indivíduos aparentam habitualmente um quase total isolamento em relação ao mundo que os rodeia. Os seus padrões comunicacionais são pobres e manifestam um grande desinteresse pelos “outros”.
     Para que um indivíduo possa atingir a magnitude de tais tarefas, é necessária uma enorme capacidade de memorização para pormenores. A memorização está intimamente ligada a uma intenção para memorizar. Essa intenção estará, com certeza, associada a factores motivacionais que determinam a relevância que este ou aquele conteúdo representa para cada indivíduo. Segundo Herman e Spitz (1993), a motivação é necessária para manter a concentração e atenção durante longos períodos de tempo, tornando-se no factor mais importante para explicar os desempenhos brilhantes dos idiots savants, em determinadas tarefas. 
       O facto dos notáveis feitos dos idiots savants serem produto de uma super atenção e concentração pode parecer estranho, uma vez que para a grande maioria das pessoas decorar datas de calendários ou páginas de listas telefónicas não parecem, com certeza, actividades interessantes. Contudo, a realidade é que pelo facto de empregarem a maior parte do seu tempo em qualquer uma das tarefas já mencionadas, conseguem obter desempenhos brilhantes nas mesmas.
      Como qualquer indivíduo se dedica a tarefas que para eles lhes suscitam interesse, também os idiots savants agem consoante os seus interesses, o que explica a genialidade de cada um.  



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